terça-feira, 5 de maio de 2015

Trecho de um novo livro! Ainda sem título =]
Estou eu derrotado? Estou lacerado de tal forma que o orgulho seja menor do que a vergonha?! Sejamos honestos, foda-se a vergonha. Você, meu amigo, evoluiu para comer, beber e foder, passar teus genes para frente. Todo resto é ilusão. O terno e a gravata, a camisa passada, o crédito ao médico e o nojo pelo lixeiro. Tua carne é feita do mesmo material fétido que a dele. E não há aqui, por entre essas proposições, demérito à grande máquina que permite à consciência um plano real. Tudo o que você é foi custosamente lapidado para suportar frio, fome e stress no meio de uma selva desgraçada. Você, eu, nós pertencemos a organismos extraordinários. Apenas questiono o desperdício de tudo, visto que o homem moderno conseguiu pôr toda a complexidade e anos de evolução que construíram nosso sistema imunológico em cheque apenas por foder um macaco. E agora o cara não pode foder o amigo, nem você pode foder uma quantidade incalculável de mulheres sem proteção. Mal se pode deitar com uma mulher como você deitaria com um homem. Tudo bem, ok, a rotina enfastiosa é em nome ao progresso. Que progresso? A fibra ótica? Meu amigo, dentro de anos, não décadas, não centenários, nós vamos ter malditos robôs lotando prateleiras ao redor desse mundo inteiro, com o único e exclusivo propósito de te chupar, ou bater uma. Prontos para te dar prazer. O quão distorcido é isso?! A humanidade se perdeu há muito. O scotch melhorou, temos o computador, mas o essencial, a substância que nos define, continua a mesma e não se encaixa com a vida insuportável que nos convencemos a viver. O gozo continua o mesmo; o squirting continua sendo o raro troféu de todo homem (e mulher, diga-se de passagem;) as piores decepções não são com a Siri e sim com a fêmea com quem você trocava fluídos e partilhava medos e ensejos semanas atrás; ah, e você não é especial. E aí?! Todas as perguntas não se resumem a essa?! E aí que o mundo continua girando e eu não consigo te responder. Eu não consigo me responder. Mas não, não há derrota em qualquer emoção humana. Há retrocesso para o progresso, e aprendizado. O mundo dá voltas e termina sempre no mesmo ponto. Por que deveria ser diferente comigo nas poucas e míseras décadas de vida que eu tenho sob a luz do sol?

Felipe Peloggia

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

“... Mal sabe o homem,
Que nasce cego à dor,
Mudo ao horror,
E surdo ao amor,
O excelso fulgor que o calor
De corpo com corpo
Há de ensinar,
Por amor ou por dor,
A perder o porquê do existir,
Existir sem perder o porque,
Ou perder o existir sem porquê.
E tudo isso,
Sem pedir para nascer...”

Felipe Peloggia


Propósito

     Não se sabe até aonde o aceitável limita censuras éticas universais, onde o comportamento perde o exotismo lascivo e passa a exortar o indigno, eviscerando o senso de justo. A filosofia não reconhece o belo e desconhece o feio. Não se sabe o que é o que. O importante é que a trilha de tijolos leva o racional à uma explosão de sentidos: o cheiro irresistível de tinta fresca desbotada, de terra, de sangue que corre no chão.
     A mulher chora por amor ao oposto de si; pelo homem que não é; chora por amor. O homem chora por não calçar os sapatos do pai. O mundo gira em torno do próprio despropósito até que o poeta, coitado, que esperava ter o sentido da vida designado a si por versos em prosa, percebe que o sentido quem dá é ele, e o propósito, nada mais é do que o caminho e caminhar.

Felipe Peloggia

Passado Futuro

Um velho homem,
Em velhos trajes,
Sobre o duro asfalto
Da velha cidade,
Anda solene em passos
Marcados.
Compasso.

Bate o ponteiro intimorato,
O relógio canta
Desbravando tempo novo,
Futuro passado.
O velho sorri
Ao ver o jovem chorar.
Bate o ponteiro, faz o mundo girar.
Mal sabe o jovem
Que o que faz o tempo passar
É o lembrar.

O velho acende o cigarro
Sem saber do último trago
E contempla a bela,
Velha cidade,
Os belos e velhos sapatos,
Os braços cansados
E o calor do amanhecer,
Que tantas vezes testemunhou,
Antes do labor e do andar,
Do construir e conhecer
Cada curva do existir,
De amar sem se arrepender.

O cigarro chega ao fim,
O sol sai do ventre do inconsciente
Por entre prédios imponentes.
Perde-se o chão,
O mundo gira em lentidão.
Os tons de cinza desvanecem
Em desconexa harmonia.
Enquanto chorava o jovem,
O velho ria.

Felipe Peloggia