terça-feira, 19 de março de 2013


     “Boa sorte”. Com isso, enquanto Luan direcionava-se para o segundo andar para conversar com Alice, João levantou, pegou uma garrafa de água que estava jogada no chão e foi para a área da piscina esticar as pernas. Ainda estava amanhecendo, João estava com frio, mas não se importou. Acendeu um cigarro e caminhou em direção ao parapeito nas extremidades da cobertura. Woah, pensou ao olhar lá embaixo. E a Karen? Mas que merda, Jhonny; lembrava, ao mesmo tempo recordando de Daniela derramando lágrimas custosas por sua causa. Primeiro um pé, depois o outro. Após alguns segundos, talvez minutos lutando contra o desequilíbrio, conseguiu manter-se de pé sobre o parapeito. A garrafa de água em uma mão e o cigarro na outra. Era absolutamente desconcertante olhar para baixo. E a Karen, Jhonny? E a Karen?, ele podia escutar em meio à densidade emocional em que se encontrava. Colocando o cigarro em sua boca, jogou a garrafa de água para traz e abriu os braços, admitindo a tormenta que o revolvia em todas as acepções possíveis. Com os olhos fechados era mais fácil – tudo com que tinha que se concentrar era em puxar ar para o cigarro e tragá-lo. A noção de equilíbrio, porém, tornava-se mais incerta e volátil. Ele não se importava. A ideia era até mesmo excitante, libidinosa. E para o grand finale...

terça-feira, 5 de março de 2013

Interminado


     João estava sentado, a sala estava escura se não por alguns raios de luz do por do sol que passavam por algumas frestas da janela. Os rituais repetiam-se incessantemente, tresloucadamente, numa compulsividade insólita e desenfreada. Alguns fulgores criativos davam ritmo ao passo em que palavras eram impressas na folha à sua frente, seguidos por momentos silenciosos. Um trago no cigarro, outro no copo, e nada. Ele pegava o copo, o girava na mesa, dava outro trago, o girava novamente e nada. Ao servir outra dose, passava o dosador da garrafa de Jhonnie Walker Black com as últimas gotas que sempre respingavam na parte de trás de sua mão e tomava. Nada. Em momentos levantava da cadeira, com respiração acelerada, angariando por um súbito estro absoluto e despótico que desse pulso em seus escritos. O cigarro queimando, deixando rastros de cinza no cinzeiro, esquecido, ou em seus dedos, fazendo companhia a João no processo solitário de tecer palavras. Nada. Nada. Nada. Até que um fragmento de ideia o impulsionava por mais algumas páginas. Às vezes era necessário reescrever alguns parágrafos, em outros casos, amassar ou rasgar uma folha inteira e mover-se para a próxima. Por horas o ritual se repetia. Refeições eram ignoradas e ligações não eram atendidas. O mundo fora daquela sala não existia, ao menos não pelas últimas dez, doze horas. Era como se ele mesmo não existisse; apesar de sentir com veemência cada ensejo, frustração e impaciência frente à necessidade inexplicável de escrever, quando finalmente, nos poucos momentos de inspiração, escrevia, a experiência era incorpórea, quase transcendente.